Relatos do Carnaval do Recife
É sabido que os diversos eventos que ocorrem durante o carnaval de Recife, espalhados pelos diversos Polos, atraem turistas do mundo todo e movimentam consideravelmente a economia da cidade. Em matéria publicada em 08 de fevereiro de 2008, por exemplo, o Carnaval daquele ano circulou cerca de 700 mil turistas pelo estado pernambucano, movimentando cerca de R$315 milhões. Com toda certeza, essa enorme movimentação de turistas contribui também para reafirmar a imagem de uma região do nosso país onde a cultura local é extremamente rica e diversificada.
Esta imagem é capaz de cativar as demais regiões do país, uma vez que Pernambuco tem o privilégio de colecionar uma grande variedade de símbolos e referências da manifestação da cultura popular, exclusiva da região. Grande parte dessas manifestações (pra não dizer TODAS) provém de comunidades simples, que cultivam características particulares, e conseguem através do amor e da dedicação a sua tradição, a manutenção e continuidade das atividades culturais ligadas ao carnaval do estado.
No entanto, essas agremiações que trabalham durante o ano todo, sem mencionar a dedicação projetada ao longo dos anos de existência (e resistência) de cada tradição, vêm encontrando diversas injustiças e obstáculos durante o período de carnaval.
Enquanto atrações de palco com celebridades da música mundial acumulam um aparato muito maior de produção, estrutura e até mesmo de prestígio, a cultura local ainda enfrenta necessidades básicas.
ABERTURA DO CARNAVAL:
A famosa abertura de carnaval com Naná Vasconcelos é um evento que chama muito a atenção do público, muito embora coloque as nações em uma situação de coadjuvantes em relação ao prestígio depositado ao próprio Naná e aos seus convidados. A tão falada musicalidade do maracatu acaba sendo prejudicada. Tanto pelo fato de o próprio condutor do espetáculo não ter nenhuma ligação com o maracatu – nem participativa, nem religiosa – como pelo fato de os convidados também não terem relação estreita com esta manifestação.
Estes fatores acabam por fazer com que a união musical dos mesmos torne-se confusa e pobre, mesmo que sejam feitos ensaios antes da abertura em si. Um melhor planejamento deste evento, mais coeso com a tradição, valorizaria às características particulares da manifestação.
Henrique Barros e sua filha Alice
DESFILE OFICIAL
Quanto ao desfile do concurso entre agremiações, podemos observar diversos problemas. As condições estruturais de passarela e arquibancada deixam muito a desejar. A passarela é muito precária. Estreita demais para comportar agremiações que tem mais de 300 componentes. O Recuo não comporta os instrumentistas. O Som não suporta o tamanho da passarela nem a potencia dos Tambores de um Maracatu de Baque Virado, que tem mais de 150 integrantes (só na percussão). A estrutura da arquibancada não comporta o público de maneira correta. A proximidade na qual as pessoas se posicionam na arquibancada, em relação aos passistas, complica tanto a segurança, como o desempenho do desfile como um todo. Qualquer um que quiser pular da arquibancada, tocar um passista ou mesmo jogar objetos, tem total facilidade para tal (como já foi observado em diversos anos). Considerando ainda a relação de rivalidade que muitas vezes existe entre algumas agremiações, tais fatores abrem portas para o acontecimento de confusões completamente desnecessárias ao momento do desfile.
O evento da passarela ainda enfrenta problemas como a falta de divulgação (nota-se que a formação do público da arquibancada é composta em sua maioria pelos próprios integrantes das comunidades) e a falta de estrutura e planejamento para que haja transmissão pela TV.
Já em relação ao julgamento, encontramos os mais motivos para indignações. A falta de clareza e a má formação da comissão julgadora incomoda muito quem é julgado. Os mesmos jurados julgam agremiações completamente diferentes umas das outras (Troças, seguida de Blocos, e Maracatus, e etc…), e passam horas seguidas com pouquíssimos momentos de interrupção e descanso.
Fora o fato de alguns dos critérios de julgamento contidos no regulamento do concurso ser questionado por todas as agremiações, sendo mantidos sem motivos pela comissão de organização do Concurso.
NOITE DOS TAMBORES SILENCIOSOS
Após o ocorrido durante o Carnaval de 2004, a organização do Carnaval de Recife deu fim a grande magia que existia na tradicional Noite dos Tambores Silenciosos. Ao invés de investir na segurança e no policiamento do Evento, a organização do Carnaval modificou o trajeto dos Maracatus ao se apresentarem, impedindo que um batuque de Maracatu cruzasse com outro batuque, momento em que havia uma ‘disputa’ saudável de qual Maracatu tinha o Baque mais forte.
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Segue abaixo alguns fatos ocorridos nesses últimos anos durante o Carnaval de Recife que poderiam ter sido evitados,
caso houvesse um policiamento adequado.
2004 – Durante a Noite dos Tambores Silenciosos houve uma grande briga que durou mais de 30 minutos, sem a chegada de nenhum policial, que acabou por dar fim ao público que assistia as apresentações dos Maracatus.
2006 – Por falta de Policiamento adequado na concentração para os desfiles oficiais, um amigo do Maracatu Porto Rico foi improvisadamente inserido no desfile da agremiação para não ser lixado por ladrões após uma tentativa frustrada de assalto.
2007 – Durante o Cortejo de abertura do Carnaval, para a chegada dos Maracatus ao Marco Zero e encontro com o Naná Vasconcelos, um ‘bloco de carnaval informal’ (um grupo de amigos) com cerca de 10 homens totalmente alcoolizados atravessaram no meio do batuque do Maracatu Porto Rico, causando revolta em diversos batuqueiros, e um principio de confusão que quase virou briga.
2008 – No desfile Oficial (Passarela) do Maracatu Porto Rico, houve invasão de ‘torcedores’ que estavam na arquibancada assistindo ao desfile, e tentativa de agressão a alguns integrantes do Maracatu que ESTAVA EM PLENA APRESENTAÇÃO!
2009 – Houve diversos relatos de brigas entre torcedores de agremiações rivais, nas arquibancadas da Passarela, inclusive uma grande pancadaria em pleno desfile do Maracatu Porto Rico.
2010 – Durante a entrada para o Desfile Oficial do Maracatu Encanto do Pina, literalmente na boca da passarela, o Bloco do Saberé com um enorme carro de som e seus diversos integrantes e pessoas que acompanhavam o trajeto do seu cortejo, atravessam bem no meio de todos os integrantes do Maracatu Encanto do Pina causando enorme descontentamento, desconcentração de todos seus componentes, além de desarrumar toda a formação do Maracatu que já estava pronto.
2011 – TIRO E MORTE na CONCENTRAÇÃO da PASSARELA – Na Avenida Dantas Barreto, local da concentração de diversas agremiações para o desfile oficial na Passarela, disparos de tiros e a morte de um homem aconteceu sem a presença de um policial se quer. Logo em seguida, diversas viaturas policiais entre carros e motos, além da ambulância do SAMU, transitaram bem no meio de onde o batuque do Maracatu Porto Rico (tentava) se concentrar. Crianças e senhoras, além de diversos turistas que acompanhavam a concentração destas agremiações, deixaram o local com medo.
Henrique Barros – Kapitão – é músico, arte-educador, pesquisador e militante da Cultura Popular Brasileira.